terça-feira, 9 de março de 2010

além do olhar

Acordou preguiçosa, como todas as manhãs. Permitiu-se ficar mais 10 minutinhos naquela embriaguez saudável, entre sono e vigília. Pensou na vontade que tinha de poder simplesmente ausentar-se de tudo.
-Quem sabe ligo pro chefe e digo que peguei dengue? Mas e se acabar pegando mesmo, afinal estamos numa baita epidemia. Não vai dar pra ter duas vezes...
Voltando do devaneio da fuga, nada a fazer senão levantar e enfrentar o dia.
Banho tomado, engole o copo de leite às pressas e assume o volante do seu pretinho básico, como carinhosamente o chama.
No caminho ao trabalho, parada no semáforo, já impaciente com o atraso que vai lhe causar problemas, assusta-se com um estrondoso barulho. Do outro lado da avenida, no cruzamento, dois carros bateram feio.
À sua volta, alguns buzinavam para que seguisse em frente, apressados como ela.
O jovem rapaz que estava ao lado da sua janela, tentando vender canetas e balas, perguntou à ela, entre assustado e ansioso:
-Será que alguém se machucou?
-Não sei, não dá pra ver. Mas a batida foi forte.
- Vou até lá tentar ajudar.
Detalhe: ele era cego.
E, movendo-se por entre os carros, guiando-se através da bengala nos pneus, lá foi ele.
Ela passou a marcha e seguiu em frente, fazendo uma pequena prece por aquelas pessoas.
Seu dia não foi mais o mesmo depois disso.

Um comentário:

Solange Maia disse...

só os tolos acreditam nos limites...

ver vai além dos olhos, não é ?

beijocas