“Abandonar-se à imensidão do mar como um barco à vela, solto ao vento, enfrentando tempestades e calmarias em busca do ansiado porto seguro.”
*Eu estava com essa frase na cabeça quando cheguei à praia naquela manhã cinzenta. Um tanto distante, à minha direita, um jovem entrava na água com sua prancha de surfe.
Mas antes de molhar a cintura, ele pára e com certa reverência faz o sinal da cruz. Percebo o quanto aquele momento de reverência tinha deixado o jovem concentrado.
Ele percebe, e eu desvio o olhar rapidamente. Olho para o horizonte e tento enxergar o que ele enxerga. Vejo um mar e um sol simplesmente, e ainda procuro meu porto seguro. Viro o rosto, vejo o dele e miro um olhar simples e pleno de quem vê beleza em tudo.
Mas um olhar nunca revela tanto quanto você gostaria de acreditar. Eu fui à praia naquele dia para espairecer, contemplar. Não imaginei por um segundo sequer, que o que se passava na cabeça daquele jovem surfista poderia ter me levado tão longe.
Acho que a onda que leva também traz. É como os sentimentos. Calmos num momento e revoltos
Alguma coisa naquele rapaz me tocou e de certa forma mudou o meu dia. Ele se prepara para enfrentar o mar, a aventura, o perigo.*
E tudo de que precisa está lá: prancha, músculos, vontade e fé. O mar está agitado, conseqüência da virada de tempo da noite passada. As ondas estão se quebrando com força, formando um larga faixa de espuma próximo à praia.
Eu observo com admiração enquanto ele abraça a prancha e caminha confiante mar adentro. Mais adiante deita-se sobre ela, remando com braços fortes e cortando seguidas ondas até ultrapassá-las. Fica ali, algum tempo, no sobe e desce daquele mar que respira a plenos pulmões. Até que a escolhe. Atira-se sobre ela.
Vejo ao longe a beleza daquele jovem, desafiando o mar.
Sorri.
Cheguei à praia naquela manhã como velejadora.
Retornei surfista.
( o trecho entre * foi escrito em parceria pelos meus novos amigos do laboratório do escritor, num interessante e mobilizador exercício coletivo )
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